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Tema de Redação da UFRGS de 2023 – “Qual História pode e deve ser ensinada?”

O tema de redação da UFRGS do ano de 2023 e acesso 2024 foi “Qual História pode e deve ser ensinada?”. O tema tinha como base o texto motivador com o título “Deixem a História em paz” de Jaime Pinsky. Baseado na leitura, você deveria escrever um texto que concorda ou discorda dos pontos apresentados do texto e que deveria ser lido em um grupo de discussão sobre o ensino de História na escola entre pais, alunos e professores.

Você pode conferir as instruções e o texto motivador neste link ou vê-los a seguir:

Em junho de 2022, Jaime Pinsky, historiador, editor, professor Titular de História da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e Livre Docente pela Universidade de São Paulo (USP), publicou um texto no Jornal Correio Braziliense, em que apresenta seu entendimento a respeito da História e do ofício do historiador. Leia o texto abaixo.

Deixem a História em paz
Se as lições da História fossem claras, Solano Lopez não seria considerado herói no Paraguai e bandido no Brasil, e Duque de Caxias não seria cultuado no Brasil e considerado um carrasco sanguinário no país vizinho. Ouço, em conversas informais, médicos, advogados, economistas e administradores de sucesso me informando (consolando?) que pensaram em estudar História, admiram muito os historiadores e gostam das lições que ensinam. Sinto decepcioná-los, meus caros, mas história não é para amadores. Na verdade, a maioria nem sequer tem ideia do que é História, embora todos se sintam no direito (obrigação?) de palpitar sobre o assunto, e até de exigir a troca de professores em muitas escolas.
Mas vamos por partes. Sim, senhores, História é uma área de conhecimento que nos toca profunda e diretamente, não é aquela coisa idiota e decorativa (nos dois sentidos) ensinada em meados do século passado no Brasil e em muitas escolas de primeiro mundo até hoje. Basta examinar livros didáticos, supostamente de História, em escolas públicas nos EUA: não passam de compêndios parecidos com listas dos infindáveis presidentes americanos e alguns cidadãos de destaque, algo sobre suas vidas, outro tanto sobre suas obras e poucas e até nenhuma palavra sobre as sociedades em que atuaram, a condição das minorias, a democracia na prática (não só a democracia formal), o papel das mulheres, a vida dos indígenas, dos negros, dos imigrantes e assim por diante.
História não é a narrativa, ou uma narrativa, nem qualquer narrativa sobre coisas que aconteceram. História implica se apropriar do passado a partir do presente. Se um estudioso de qualquer época e de qualquer tema do passado decide pesquisar algum fato que tenha acontecido, ele vai, obrigatoriamente, olhar esse passado a partir do seu presente. E seu presente, o ponto de vista a partir do qual ele se dá conta daquilo que aconteceu, será, hoje, diferente do ponto de vista de alguém que estudou esse passado há, por exemplo, um século. Um elefante será sempre um elefante, mas se o ponto de vista levar o observador a conhecer o elefante pela frente, ele poderá ver uma tromba enorme, mas se o enxergar por trás, verá apenas um rabinho. Deixando a zoologia de lado, é evidente que não se pode deixar de considerar a historicidade do próprio historiador.
Uma historiadora que se debruce hoje sobre a história das mulheres no período colonial brasileiro será levada a fazer investigações que outra, vivendo um século atrás, não terá feito. O comportamento, a prática social, a relação que as mulheres têm com o próprio corpo, a moral sexual, os objetivos profissionais, até mesmo seus anseios e sonhos têm a ver com sua realidade econômica, política, religiosa. Mulheres da Arábia Saudita só receberam autorização para dirigir veículos há poucos anos e isso, seguramente, pode parecer revolucionário para moradoras de países vizinhos, algumas ainda sujeitas a imposições machistas vestidas de dogmas de fé.
Mas a coisa toda parecerá um arcaísmo insuportável em sociedades que superaram esse dilema há muitas décadas. O historiador precisa ter sensibilidade e conhecimento empírico e teórico para pesquisar, entender e apresentar a questão. História não é para amadores. Uma questão precisa ficar clara: História não tem partido, não é de esquerda, nem de direita. Quem trabalha com ela precisa utilizar todas as técnicas que aprendeu, na faculdade ou fora dela, para não confundir a atividade docente com um espaço de pregação política. Seu compromisso, como docente, é com o conhecimento histórico estabelecido a partir de pesquisas feitas por gente séria.
Hoje, temos centenas de cursos de história no país, com gente boa se formando em muitos lugares. Temos também livros sérios que apresentam questões fundamentais da história com linguagem acessível a professores e alunos. Buscar obras de qualidade para ter bons pontos de partida é uma atitude necessária para não transformar a sala de aula em campo de batalha, ou palanque político. Por outro lado, cabe aos dirigentes educacionais oferecer suporte aos seus docentes. Tenho visto um movimento inaceitável de pais de alunos querendo interferir em programas de curso, em abordagens de temas sensíveis, chegando até a instrumentalizar seus filhos para questionarem de modo grosseiro os professores quando estes não apresentam abordagem histórica que os interessa.
Ler para os filhos, ler com os filhos, ler para dar exemplo aos filhos é, sem dúvida, uma forma melhor de ajudar o processo educacional do que insurgi-los contra os professores de História. Pedir para que as escolas cuidem mais da iniciação científica de seus alunos, para que o país tenha ainda alguma chance de chegar a um patamar que desejamos, é outra. É só querer ajudar de verdade.

PINSKY, J. Deixem a História em paz. Disponível em: . Acesso em: 27 set. 2023.

O texto é claro: o Professor Pinsky é contundente em defender seu ponto de vista, especialista que é em sua área do conhecimento. Podemos, a partir da leitura de suas ideias, destacar um conjunto de argumentos que o levam a defender suas opiniões; e isso não apenas sobre a História narrada em livros, mas também sobre o papel que têm, na construção dessa narrativa, a escola, os alunos, os pais de alunos e a comunidade em geral.
Agora, considere a seguinte situação.
Você está no último ano do ensino médio e faz parte de um grupo formado por pais, alunos e professores cuja função é debater o futuro do ensino na sua escola. Desta vez, o ensino da História será o grande tema de discussão: Que História pode e deve ser ensinada?
Esse assunto tem grande relevância, porque ele faz pensar sobre o nosso passado e o nosso presente; ele também faz refletir sobre manifestações de preconceito, de intolerância, de autoritarismo, de racismo e de tantas outras formas de discriminação. Uma boa discussão a respeito de tudo isso faz ver e entender melhor nossa conexão com a História da humanidade, o que inclui avaliar nossas ações, tanto positivas quanto negativas. A partir disso, podemos criar sociedades mais equitativas, justas e inclusivas.
O texto “Deixem a História em paz” certamente é um bom ponto de partida para o debate sobre o futuro do ensino de História em sua escola e, por isso, foi apresentado ao grupo do qual você faz parte, como forma de dar início à conversa.
Após a leitura feita pelo grupo, decidiu-se que algumas pessoas deveriam apresentar uma opinião fundamentada sobre as ideias veiculadas pelo texto do Professor. Você está entre as pessoas escolhidas. O conjunto dessas opiniões conduzirá o grupo a levar em conta, ou não, o texto como um parâmetro.
Como um dos escolhidos, você foi encarregado de dissertar sobre as ideias do texto “Deixem a História em paz”, de Jaime Pinsky. Nessa dissertação, você deverá apresentar ao grupo o seu ponto de vista a respeito dos argumentos expostos pelo historiador. A sua dissertação será lida perante o grupo e, certamente, será levada em conta para auxiliar a balizar o futuro do ensino de História em sua escola.
Lembre bem: você terá a oportunidade de opinar sobre algo que pode ter grande impacto na sua escola, o que pode incluir outras disciplinas do currículo e, na formação da cidadania de seus colegas.
Bom trabalho!