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"Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá" Lima Barreto UNICAMP 2025

“Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá” de Lima Barreto – Resumo de Cada Capítulo

Lima Barreto foi um escritor que tinha muitas obras panfletárias, isso significa que muito do que ele escreve mais vende uma ideia do que de fato uma narrativa, mas isso não desqualifica ou diminui seu trabalho. A obra mistura ficção e uma parte da vida do próprio Lima Barreto.

O livro começa com uma advertência, que Augusto Machado pediu para publicar a obra, que parecia precisar de exatidões para a obra ficar boa, mas dispensou, e uma explicação necessária, explicando de onde nasceu essa monografia, da consciência de divisão de trabalhos tanto de Lima Barreto quanto do doutor Pelino Guedes, nem se julga com a verdade e muito menos de saber da arte de ser doutor. Por fim, Augusto Machado pede perdão.

São 12 capítulos

Capítulo I – O inventor e a aeronave

O narrador, Machado, nunca pensou que Gonzaga de Sá se importasse com balões. Porém, ele retoma ao dia que o conheceu, pois foi à Secretaria de Cultos de um caso do Bispo de Tocantins que só recebeu 16 salvas de tiros em vez de 18. Conversaram muito, elogiaram e resolveram nada. Até pesquisavam outros países para poder separar bem as salvas de tiros e de cada religião. O caso ia de secretaria para ministério, de culto para estrangeiros e guerra, este último que decidiu adicionar um de canhão que reduziria o número de salvas mas satisfazia o prestígio. Isso que surgiam dúvidas de o que fazer a partir de agora com essas salvas. O narrador até fala da importância da secretaria de Cultos, maior que da Aviação, e nessas empreitadas no lugar do diretor, conheceu Gonzaga de Sá, que analisava quantas setas devia ter a imagem de São Sebastião. Era “um velho alto, já não de todo grisalho, mas avançado em idade, todo seco, com um longo pescoço de ave, um grande gogó, certa macieza na voz grave, tendo uns longes de doçura e sofrimento no olhar enérgico. A sua tez era amarelada, quase dessa cera amarela de certos círios.”. Julgava-o de um passado antigo de família, ele até quase casou duas vezes, com uma filha de visconde e uma lavadeira. Ele ia frequentemente aos cultos, mas não de enriquecimento como a nobreza, mas de alma. O narrador comenta que para conhecer bem um homem precisa saber como ele morreu. Conta de Lord Bacon, cheio de vilania, mas que morreu tentando ver como o frio podia reviver alguém com um frango. E o narrador volta para contar de Gonzaga de Sá. Esperava-o em um morro, via o mar, fumava e apreciava o horizonte, descreve toda a região litorânea, pensava e avaliava sobre toda sua vida e pode ser bom com o que lembrou e também desprezou outras coisas. Estava melancólico, tal como a cidade e pausou a reflexão, pensava que a criação e a atualidade eram harmoniosas, os avós de Portugal e África se conectavam e era fruto e espelho do lugar. Pensou até nas referências de leitura estrangeira, considerou que sabiam muito pouco mas também achava que sabia menos ainda. O amigo chegou, reclamava dos ingleses, sempre apressados, disse que nem para alguém como se ele estivesse indo a morte devia se ter pressa, o narrador se arrepiou de pensar em morte. Iam a casa de Gonzaga jantar, ainda que ela não estivesse lá e foram a pé. Falaram de quem morava por ali, falava de novo da morte e como lugar e gente se conectava a isso. Ao chegar em casa, ia pegar uma flor no jardim que oferecia ao narrador, caiu e morreu. Deixou ao narrador o seu legado, tinha uma obra escrita chamada “O inventor e a aeronave”, decidiu publicar pois considerava-o muito inteligente. A narrativa fala de um homem fixado e focado em construir aeronaves, estudava e até deixava de dormir. Por vinte anos, escreveu um projeto e finalmente dormiu bem. No dia seguinte, traçava os custos e materiais necessários e partiu para a oficina para montar. Montava com meticulosidade e polia tudo para ser perfeito. Mal dormiu na noite que antecedia o vôo, já no amanhecer, apaixonado e saboreando o momento, ligou o motor e a máquina perfeita não voou. Era “o que havia na folha amarelada de almaço”. O narrador não entendeu de primeira vez, mas julgou que era uma metáfora ao Acaso, que, por mais que você seja sábio ou se prepare, nem Deus pode intervir contra o Acaso.

Capítulo II – Primeiras informações

“Manuel Joaquim Gonzaga de Sá era bacharel em letras pelo antigo Imperial Colégio Dom Pedro II.”. Teve boa educação, conhecia psicologia, metafísica, não foi casado e apenas amou duas vezes, a filha do visconde e a lavadeira. Podia ser muito sendo filho de general, “não quis.”, devia passar por muitas solenidades e formalidades que o aborreciam. Era razoável trabalhador, até teve dia que trabalhava quando Deodoro declarava república em Campo de Sant’Ana. O narrador lamenta que o brasileiro não aprecie outras inteligências como a de filosofia e sociologia, que deixam evidente a diferença de quem estuda e não. Ou escolhem funcionalismo ou doutorado. Possuem ânimo no começo, mas vai esvaindo ao longo dos anos e param de estudar para só conversar. O narrador conhecia um escriturário que foi para a Europa com 14 anos pelo pai rico, estudou muito por amor das religiões de lá, voltou pela falta de dinheiro e não tinha o que fazer pelo Rio. Até participou dum concurso, passou, foi vivendo, 15 anos depois morreu e deixou saudades na repartição, principalmente pela letra, considerando-se um besta. Gonzaga de Sá não tinha conhecimento excepcional, mas tinha um bom e firme ponto de vista com ideias e resistindo à depressão do ambiente de trabalho. Ele mostrava inteligência, mas retinha-se para publicar qualquer coisa, o narrador desconfiava o que podia ser. Sempre aprendia algo novo, não era repetidor, podia ser que a mente sempre ativa o mantivesse até o sessenta, o tratava por senhor e depois de um ano que deixou de usar. Talvez por não ter filhos, só podia oferecer um conhecimento vasto e polido. Gostava de estudar e de revistas, via nacionais e internacionais, e também jornais ilustrados meteóricos que seria explicado mais tarde sua opinião. Após tanto tempo, agora com retrato que encaixava em Gonzaga de Sá, ouviu boutades, piadas, de Gonzaga de Sá. A biografia é despretensiosa e contaria conforme fosse. Contaria uma engraçada logo.

Capítulo III – Emblemas públicos (capítulo importante)

“A nossa insuficiência nas artes do desenho é manifesta.”. Não falta técnica, mas as armas e brasões mostram a falta de criatividade, além da poluição de sobreposição. Salvo o do Rio de Janeiro de forma irônica, todos são cretinos. Os tempos de colônia mostram como havia bom gosto antes. Conta também de quando viu o chafariz do Largo do Paço e como ele faltava beleza do mar chegando a ele. Ao cair a noite, viam as estrelas. As mulheres passam depressa por ali, Gonzaga se questiona do medo delas, o narrador responde que os homens não são bons, sejam eles familiares ou amantes. Saem dali e o narrador ia escrever cartas aos parentes de Minas, no dia seguinte, ao enviar, encontrou Gonzaga de Sá, fitando alguns selos, via os novos brasões e chamou para o narrador verificar. Gostava da arte e inspiração mas sentia falta de informações biográficas, para saberem mais e até poderem saber o valor deles em moeda e história. O narrador concordou e Gonzaga de Sá pediu que escrevesse a carta.

Capítulo IV – Petrópolis

Gonzaga de Sá reclama da mania do brasileiro de aristocracia e de ter sobrenome, ignorando história, respeito, e apenas focando em ter um nome, degradaram as regras de linhagem. Caminhando pelas quatro da tarde no Pedregulho, Gonzaga de Sá sugere ir ao Engenho da Penha, o narrador perguntou onde era e Gonzaga de Sá comentou que só conheciam Tijuca e Botafogo. Ele explica onde é e como parece. Tomaram o trem, um dos de Petrópolis, foram de primeira e de segunda classe, Gonzaga de Sá até leu o jornal e o narrador viu os mangues. Chegaram e tomaram uma cerveja, precisavam andar um pouco., recitou um La Fontaine e depois reclamou da gente de Petrópolis, estrangeiros sem cultura, diferente de Gonzaga de Sá que era do Rio de Janeiro, com seus negros, tamoios, mulatos, galegos e cafuzos. Perguntou se o narrador lia as notícias de Petrópolis e aconselhou que o fizesse quando ouviu a resposta negativa, ainda que fosse pequena merecia atenção. Eram mundanas, mas queria ler revoluções. Queria inversões, mas não tinha como, o narrador dizia que era uma cidade com nenhuma história e pouca fantasia. Viam uma plantação, uma portuguesa no campo e o mar. Viram um ilhote que ficava no meio do canal com paredes de sobrado, era o Cambambe, explicava Gonzaga de Sá, era para comunicação antes das estradas de ferro. O antepassado de Gonzaga de Sá, Estácio de Sá, morreu naquela ilha na frente de ferimento de flecha, sendo levado para tratamento, e o narrador via tudo aquilo e quase via a cena em sua frente. Ler página 27

Capítulo V – O passeador

“O que maravilhava em Gonzaga de Sá era o abuso que fazia da faculdade de locomoção.”. O narrador o achava por toda a parte, subia, descia, andava, mas sempre fumando e devagar. Até já o seguiu para ver como era. Ele ia com a bengala nas costas, andando por aí e vendo os prédios e lugares de antigamente para conferir a arquitetura, que comprovavam que o tempo passava e ele não tinha mais a infância para recorrer. Teve um dia que faltou à repartição, seria contado mais tarde, e um casebre de mais de 50 anos que conhecia foi derrubado, amava os detalhes da cidade, falava com gosto, via, e repudiava os subúrbios. Ele também se incomodava como o Rio se dividia de forma grosseira e não tinha uniformidade de um grande centro como outros tantos referenciais. A cidade se dividia pelas colinas e ela sofreu o crescimento de qualquer cidade, mas as regiões não se conectavam uniformemente, demorava-se para poder ir e não se mesclam, há ricos que moram em áreas pobres e o oposto, isso dá um ar único à cidade ao menos. Como o narrador tinha nada para adicionar, só concordou. Ler página 35.

Capítulo VI – O Barão, as costureiras e outras coisas

Gonzaga de Sá contou de quando o Barão do Rio Branco recebeu a vista de um poeta e perguntou da grafia de amor, com ou sem maiúscula. Ele comentou que no meio não havia necessidade, mas no começo era necessário. Gonzaga de Sá falava da palavra “Barão” com gosto, gostava da honra de receber o título de Imperador, não gostava dos títulos políticos e como o fizeram com o Barão do Rio Branco, detestava essa endeusificação, a popularização dele e de como ele fazia o que bem entendia. Ignorava lei, puxava para seu lado e deixava até a filha na míngua. Detestava como se aproveitava do sistema. Estavam ao banco do Campo de Sant’Ana e iriam ver o Teatro Provisório. Ao verem, ficaram sentados apreciando a paisagem. Dado momento viram uma menina bonita acompanhada das velhas mães. Gonzaga de Sá e ele a viram e ela ficou aparentemente contente ao colher os olhares, ainda que fossem sempre escassos visitantes no parque abandonado. Gonzaga de Sá lamentava não ter tido intimidade com alguma costureira. O narrador elogia a função de costureira, como quem modela e sabe como modelas as pessoas. Gonzaga de Sá tecia um comentário levemente sarcástico, pois ele sabia da importância da vestimenta na sociedade, ele não dizia sobre amor ou coisa parecida, mas de ter ficado ignorante dos ofícios e produções. E, ainda assim, ainda que quisesse saber mais, tudo aquilo de roupa era para achar casamento. O narrador achava perverso, mas Gonzaga de Sá não gostava da artificialidade do Rio de Janeiro de classes, ações sociais, classes. Ele validava que o que importavam eram indivíduos, a ideia de generalizar ou de fazer média não ajudava. Da mesma forma que se entendem formas geométricas apenas dentro da geometria e se perde a ideia quando se sai dela, as referências de classe, cortesia e interações sociais se eliminam quando se saem de gabinetes e escritórios. A noite veio, viram uma mulher com as pernas mostrando com medo de chuva e foram andando pela rua da Constituição. Quebrando o silêncio, Gonzaga de Sá ainda queria comprar algumas revistas e desceram pela avenida em direção à rua do Ouvidor.

Capítulo VII – Pleno contato (capítulo importante)

O narrador volta ao caso do cardeal na Secretaria de Cultos, foi tratar com o diretor, o Barão de Inhangá. Era velho, estava lá a tanto tempo quanto do Império e da mudança do Rio de Janeiro, era vadio e entendia de nada. Gastava o tempo de abrir e fechar gaveta na secretaria, quando diretor ficava arranjando lápis pra escrever, e como o Brasil ama o filho, virou Barão com 25 anos de serviço. Na seção que foi, viu Gonzaga de Sá e seu semblante certeiro do que tratava do assunto. Gonzaga de Sá lia a situação do cardeal e perguntou como que a secretaria de Roma não estava a par do assunto. Ele era criativo e original, foi o que interessou o narrador e fez querer saber mais. Encontravam-se mais vezes e falavam por mais tempo. Entretanto o narrador sentia que algo angustiava Gonzaga de Sá, algo além do amor. Pensou se era no gênio e na procura de saber mais que vinha a angústia, teve dois momentos que o viu desenhando e rapidamente escondendo quando o narrador chegava perto. Com um misto de Por e Comte, o narrador iria mostrar que, apesar de todas as teorias, a mais simples e a mais simpática era a teoria que funcionava. Em uma quinta-feira, o narrador foi até a casa de Gonzaga de Sá, ia como se fosse noite de núpcias, queria saborear aquelas palestras, foi até o alto de Santa Teresa e foi recepcionado por um preto velho. Havia Boticcelli, Dante, Julio Cesar na casa dele, Gonzaga de Sá comentou da pontualidade e o narrador achou que ele ainda estaria nos subúrbios visitando o compadre, ele foi, piorou depois da viuvez, mas quis falar algo positivo e disse como o locai tinha mais namoradores e feministas, pois elas enchiam a região de estudo, livros, tal qual a obra de Offenbach “Grã-Duquesa” de uma sociedade invertida do papel de gênero. O narrador comentou que assim faziam até casarem, depois queimavam livros e continuava o mesmo ciclo de casamento. Gonzaga de Sá concordava que elas deviam ser o que a elas quisessem ser no momento. Mas tinham sempre coisas que mudavam o pensamento, como o que viu fazia duas horas na estação Piedade, ele viu um homem que atravessou a rua e o bonde bateu nele, ficou ensanguentado mas sobreviveu. Nessa conversa das bases sólidas da humanidade, apareceu a tia de Gonzaga de Sá, Escolástica, uma velha miúda de olhos verdes. Não conseguiu admirar tanto a septuagenária pois eles saíram da sala. Deu tempo de Machado ver uns esboços de nariz desenhados. Gonzaga de Sá retornou e reclamou de criar pombos. Gostava dos animais, criava com gosto, mas davam trabalho, gostava da forma e do jeito. Perguntou se Machado tinha fome, apesar do narrador responder negativamente, Gonzaga de Sá pediu para trazer um vinho, Bucelas branco. Gonzaga de Sá falou ternamente do velho, que o pai libertou-o na pia de ser escravo também, viveu a vida toda com ele e era um irmão de leite. Estava junto, em horas boas, ruins, como dedicação animal ou divina, Gonzaga de Sá pensava até que o amava. Ele falou com voz trêmula e tentou disfarçar pegando o jornal A Gazeta de Uberaba. Machado diz que sim, um amigo o mandava, Gonzaga de Sá se espantava com o fato dele ler, mas Machado dizia que gostava dos começos, dos inícios, de quem começava e procurava as palavras certas. Gonzaga de Sá gostou e sugeriu “A Pesquisa” de Cascadura, Machado ia ler o sumário. Tinham pesquisas bem específicas de diversas áreas, todas muito bem detalhadas e que eram bem escritas. Surpreendeu o narrador da falta de visibilidade e notoriedade, ainda mais que Gonzaga de Sá conhecia nenhum. Gonzaga de Sá atribuiu a falta de fama e reconhecimento pelos meios de comunicação, discorreu que os meios de comunicação e divulgação são os jornais, revistas e livros. Os jornais são grandes empresas, trazem política e assassinatos e buscam atrair a mesma clientela de sempre sem inovar, sabem agradar, fazem muito bem e quando alguém intelectual chega lá, precisa se adaptar tanto que é mais fácil atirar todas as ideias boas pela janela. As revistas são mesmo, com a diferença da fotografia e da busca da inteligência nova, até buscam algo novo de Portugal, mas é uma ditadura de pensamento. Machado tenta defender o público, entretanto a culpa cai nos autores segundo Gonzaga de Sá, ele destravou o segredo para achar esses novos gênios em ler revistas obscuras e jornais da província. Machado dizia que essas traziam política e assassinatos, mas aquela revista desmentia. No meio tempo que ia ler, o narrador viu o pôr do sol cheio de cores e a tia veio chamar para jantar, Gonzaga de Sá levou o jornal.

Capítulo VIII – O jornal

Foram para a sala de visita e Machado via os rostos dali, de família, homens de outros tempos. Ficava imaginando como eram, o que podiam falar e até saltar dali. Constantemente Machado vai para essas descrições que não aceitam o estático ou que misturam dualidades, como concreto e abstrato, natureza e civilização, passado e presente. Ao fitar uma foto de uma moça em traje rico de baile alto, foi explicado que era avó de Gonzaga de Sá, viu a Revolução Francesa, pois morava lá. Era semelhante à Escolástica, exceto a cor dos olhos de verde para azuis. Falava como os tios tinham cara de carrasco e a tia se ria falando que Manuel sempre teve esse gênio. Foram para a sala de jantar e Machado via longamente os móveis de jacarandá, feitos por homens fortes pela estrutura que possuía. Sentaram, o narrador via a paisagem de gente, morro e palmeira. Gonzaga de Sá contou que a casa era do pai, lutou para conservar e manter, era quase tudo a mesma coisa dizia a tia, com a diferença da Palmeira segundo Gonzaga de Sá, que tinham seus 20 anos. O narrador pensou em todos os anos que a palmeira ficou lá e como está majestosa após passar tudo. Foram servidos por um copeiro de dezoito anos, tomaram a sopa e Gonzaga de Sá quis logo ler as crônicas da Gazeta de Uberaba. Liam uma crônica da chegada de reprodutores zebus. Ele lia trechos, citava de novo partes que gostava, seja da construção, sonoridade ou criatividade. Terminou a leitura, falando de quantas vacas amorosas não o esperariam em Uberaba, a tia o repreendeu para terminar a janta. A tia também descreveu a rotina estranha do sobrinho, saía sem hora pra voltar, estava sabe se lá onde e tinha dias que nem voltava para casa, até mesmo sem janta ficava, não parecia velho, tinha mais costume era de cigano. Ele lia muito, estudava, achava estranho essas vagabundagens apesar de tê-lo criado e não entender. Teve um dia que o pai dele o pegou na janela do sótão, ele queria voar e chorou o resto da tarde. A tia Escolástica não conheceu o pai, não podia, a situação após a guerra contra as Rosas dificultava. Falavam dos irmãos, todos mortos, sem descendentes, só uma irmã que vivia na Bahia, Maria da Glória, casada com desembargador, não a via mais de trinta anos e não escrevia mais de cinco anos. Gonzaga de Sá era o caçula. A mãe dele faleceu aos oito anos de idade e foi criado pela tia. Gonzaga de Sá falou meio trêmulo, mas a sobremesa chegou e nem conseguiu decifrar. Tomaram café na sala de visitas, vendo as luzes de fora. A palmeira dormiu, e os dois fumavam. Falavam de Romualdo e Aleixo Manuel, um menino de oito anos, e seus estudos. Ficava escuro e a tia reclamou da escuridão. Acenderam e o narrador vê o piano, perguntou se a tia tocava, respondeu que faziam mais de 30 anos que não, o que ele já suspeitava pela idade dela. Ela viu Gottschalk tocar e não teve mais ânimo. Gonzaga de Sá perguntou se o narrador ouviu já, coisa pouca, explicou que era diferente, fazia os olhos da tia brilharem na falta de palavras, era uma música fantástica, dolente, impetuosa como Gottschalk. Ia nos concertos durante a guerra do Paraguai com o pai. Meses depois parece que teve muita festa e descompostura. Alguns versos ficaram famosos. Falaram de como a música influenciava muitos, culpa do Império que investiu no Provisório para ter gente se encontrando. É um local que todo mundo entende e precisa estar lá para ter cultura, não há necessidade de bagagem cultural e todos gostam. Porém houve uma defasagem, desde que a nobreza não se fez, perderam-se as inspirações. Escolástica ouvia tudo quieta e deram oito horas, Machado pediu licença e se foi. Mais uma vez mergulhou-se no passado, na tradição, dos velhos bons e da mocidade, ficou mastigando as ideias da ópera e do Provisório. Pegou o bonde elétrico no primeiro carro e viu a paisagem passando da modernidade. Via crimes, mas toda sociedade os tem, assim como erros.

Capítulo IX – O padrinho (capítulo importante)

Em uma tarde no Café Papagaio, Machado via mulheres estrangeiras enfeitadas. Nisso, lembrou de Gonzaga de Sá que disse que dama fácil é o eixo da vida. Via elas passando perfumadas, brancas como mármore e cheias de vestido. Depois se expandia, via a arquitetura do redor, analisa a rua do Ouvidor e a arquitetura que mudava do Rio de Janeiro. Gonzaga de Sá comentou uma vez que elas faziam o trabalho de os polir, de trazer de volta a aspiração da beleza que tanto procuravam e mostravam em novos corpos e também móveis e roupas. Podiam até levar nosso ouro mas poliriam a sociedade. Chegavam amigos ao café e as conversas sempre variavam, mas chegavam sempre no assunto de uma revolução social por meio da literatura e da moda. Eram quatro, o narrador, Amorim, Domingos e Rangel, denominavam-se “O Esplendor dos Amanuenses”, já que era a profissão da maioria dali e ali que podiam ter prazer que não achavam no ofício. Rangel era aquarelista do futuro, mas atual pintor gênio para o gasto das etiquetas das casas comerciais. Machado falava de uma peça de teatro japonês interminável que dava sempre no jantar em conta de um hoteleiro, chamava “Tragédia”. Passou o Pedreira e Rangel quis ir com ele mas ficou ouvindo a conversa do grupo. Falaram da mania de Pedreira de traduzir tudo para o inglês, referindo-se a ele como lord Max. Chamaram-o de Super-Homem, alguém acima do bem e do mal. Domingos tinha inveja. Domingos continuava a falar da fisionomia romana, desde a época de Sêneca. Conversavam do estado espiritual e como a antecipação antes de tocar o corpo era melhor do que tocá-lo. Machado ficou surpreso ao ver que Gonzaga de Sá apareceu no café, Machado ia pela idade, mesmo que não apreciasse tanto, mas Gonzaga de Sá os refutava pela idade e o pensamento que esses lugares limitavam camadas sociais e a inteligência. Ele vinha trajado de preto como de costume e de sobrecasaca tão comum aos doutores, todos ficaram quietos e ele explicou que o compadre morreu e precisava desse favor de Machado. Tudo ao redor ficou mais intenso, a beleza das mulheres, os toques, Gonzaga de Sá ia silencioso e Machado ia ver um corpo, estava empolgado, para ver e saber o que seria depois daquilo. Ficou apertado no trem, sentia o calor e pensou que todos ali também morreriam como ele. Viam um gordo com outros três que vivia tagarelando. Pediu para que tivesse um jornal e o outro tentou vendê-lo. Outro só deu o jornal sem pedir e ele zombou falando que lembraria de levar trocado para não ficar pagando fiado para gazeteiro. Machado deixou de vê-los para ver o seu redor. Pensou que tudo aquilo um dia sairia de sua vista, pensou como que não aproveitava a vida de forma animalesca como o gordo jornaleiro. Ele amaldiçoava a educação que teve que o deixava ter esses pensamentos e não aproveitava a vida, temendo a morte. Mas era por temer a morte que devia aproveitar a vida. Voltou o pensamento ao Gonzaga de Sá, que estava quieto, pensou na perfeita relação que tinham e como nem precisavam dizer algo para estarem juntos. Chegou outro grupo e aparentemente um com anel no indicador que conversava sobre a teoria das raças. Ouvia pouco da conversa, mas a ironia foi um mais novo do grupo perguntando como que os passarinhos não tomavam choque ao irem aos fios e o mais velho que falava da teoria das raças explicou que a comunicação era fechada durante o dia. Teve algo nos namorados que vieram com o grupo de antes que irritava pela alegria, Gonzaga de Sá perguntou se Machado já namorou, ele afirmou que aos dezesseis anos, Gonzaga de Sá dizia que ele devia namorar, para não se arrepender quando fosse mais velho e enquanto tinha tempo, mesmo que Machado negasse que era algo bom. Continuaram com o bonde e andavam numa subida, viam pais gordos, cansados que andavam também com embrulhos. Iam vez em quando gritando com os carros de bois, contando tostões e usando a musculatura que tinham para puxar as crianças e as esposas. Aos poucos chegaram à praia, pensava nos operários como o alicerce da sociedade, vivendo no esforço de desenvolver a sociedade e a possível afeição dos filhos. Gonzaga de Sá apontou para um amontoado de casas, era lá. Subiam uma rua larga que se multiplicava em ruelas menores que iam sabe se lá para onde. Há uma mistura de flora, de arquitetura, de tamanhos, de mistura, os anos vão se embaralhando do que tem ali. Viam casas que lembravam o Botafogo, a Holanda, a Suíça e finalmente um chalé, do compadre de Gonzaga de Sá. Uma negra, Dona Gabriela, os atendeu, na frente de casa crianças brincavam e ela informou que o caixão chegou faz pouco e o enterro era às nove do outro dia. Perguntou de Frederico, filho da Dona Gabriela, foi buscar pão, pediu para que falasse com ele depois. Entraram e Romualdo de Araújo, o compadre, estava cercado de gente de todos os tipos de cores, Gonzaga de Sá e ele tinham educação diferente mas uma amizade profunda e terna. Viu Dona Gabriela passeando por ali, arrumando tudo, as visitas que conversavam e se silenciavam, o filho dela chegou, falou com Gonzaga de Sá e foram jantar. Machado fumava, tinha pensado muito sem chegar a nenhuma conclusão, pensava na morte. Gonzaga de Sá continuava o mesmo com os olhos ternos e o narrador vê uma mulher que não notou entrar antes ali. Sentaram juntos como velhos conhecidos, ele falava e elogiava da casa, do Botafogo e da vida, ela, Dona Alcmena, dizia que tudo acabava em morte e de nada adiantava ter algo. Era melhor que todos pudessem trabalhar para ter o mesmo segundo ele, ela preferia que existissem ricos para ele ter uma chance de também o ser, ainda que pudesse ganhar tudo com os belhos olhos dela, segundo o narrador. Ele via ela toda, pescoço, cabelo, seios, ombros, mão e a admirava, além de depois de pensar em mais coisas que só admirar. Falavam de como a felicidade vinha e só de sabia sem se dizer a alguém. Conversaram por muito tempo, até esqueceram do defunto, mas não esqueciam da morte. Ele, que era inimigo do namoro, era toda ela e se misturava em pensar no morto e nas curvas dela. Foi tudo tão automático, era o que pensava. Assim como pensou antes e Gonzaga de Sá acrescentou, ele dizia que os vivos deviam continuar vivendo, os mortos faziam o favor de lembrar porque vivemos e queremos continuar vivendo. Falava como esses sentimentos e o desejo de continuar vivendo e multiplicar era o que mantinha a humanidade, não a separação entre religião e ciência dos povos, como a teoria das raças que supersimplificava conceitos e os tornava reais, ainda que não pudesse ser possível. Foram prestar preces ao defunto, via as pessoas velhas, até mesmo analisava como a neta jovem já mostrava traços que não era mais tão jovem. Teve pena da jovem, estudaria tanto, teria tantos olhares, frequentaria cafés, tudo por conceitos e qualquer coisa abstrata que só nesses lugares de academia que existe, mas no fim de nada todo o esforço seria em vão. Então, Aleixo se pôs a chorar descontroladamente, Gonzaga de Sá o tranquilizou. Ler página 66.

Capítulo X – O enterro

O dia era bonito, Gonzaga de Sá fazia os últimos preparos, algumas mulheres choravam e Machado estava apático e aborrecido, fumava frequentemente. O caixão se fechou e nada mais. Levavam o caixão em um sol de março matutino forte, ele pesava, meninas jovens passavam cheia de vida, discutiam com pena quem poderiam ser e depois saíam a cantarolar de novo. Pegaram o bonde elétrico e o caixão passou pelas cidades, iam quatro para o enterro, Gonzaga de Sá guardava pensamentos com a testa enrugada. Gonzaga de Sá até comentou do dia bonito, nem pareciam que levavam um morto. Machado até procurava uma mágoa daquele dia, mas o indivíduo pouco mudou qualquer coisa, iam em direção ao cemitério do Caju, passaram pela rua do São Cristóvão. Até pensaram ser melhor ir por um caminho subterrâneo, que não contradiz e desse mal gosto ao enterro. Machado concordava por hábito, mas estava esgotado mentalmente e emocionalmente. Até tentou refletir de novo depois de passado um grupo de moças sobre como a civilização poderia ter trazido algo de bom e ficou quieto até chegar ao cemitério. O enterro foi breve, Gonzaga de Sá foi tratar dos atos administrativos, o caixão desceu e Machado jogou uma pá de cal sem reverência e emoção, pensava na vida que passou de colégio, infância, universidade até chegar ao portão do cemitério como se reavaliasse sua vida em pleno meio-dia. Gonzaga de Sá tomava sol na cabeça mas o narrador não queria interromper aquele momento de tristeza para lembrar de cobrir, pensou o quanto aquela amizade perdida o afetava e como a vida pode ter guiado ele a ser quieto e pouco afetuoso por idade, escala social ou algo a mais. Lamentou em voz alta a partida do amigo e foram devagar à praia, Machado se perdia em pensamentos, refletiam no motivo de se viver, Gonzaga de Sá parecia não querer ficar sozinho, apesar de não falar e nem citar o narrador, e propôs de jantarem juntos. Ficaram sentados num jardim que Gonzaga de Sá gostava muito e ficaram alheios ao redor. Tinha um rebuliço de pessoas perto dali, um casal que se abraçava, até tentou entender a pergunta do motivo do fiscal dos bondes fiscalizar o condutor, mas nada. Estavam melhor do que da manhã, narrador e personagem. Desatinou Gonzaga de Sá a falar que os desgraçados, como já pensou Schopenhauer, deviam se matar e deixar os felizes com sua felicidade. Ainda cita que não entende como existem tantas diferenças de classes e conformismo, lembrou e ficou revolta do quando viu um casamento de negros e os oficiais faziam piadas da situação econômica da festa, Machado até falou que na Europa o camponês era visto com compaixão, mas lá há literatura que absorva essas ideais e não os ignoram, enquanto no Brasil há nada segundo Gonzaga de Sá. A literatura é a mesma, um amor proibido por situação de trabalho, há tanto um dilema de família dos dois lados, mas tirando isso e o fascínio pelo pitoresco do sertão não avançam na literatura. Não há espaço ou exercício de imaginação, há um foco da simpatia pelos humildes e humilhados. Machado dizia que não há quem sofre, as pessoas são insensíveis. Gonzaga de Sá acrescentou que sofriam a própria humanidade, queria ser um escritor que escrevesse um ideal de vigor, violência, força que corrigia a bondade e a doçura dos indivíduos. Falava efusivo, mas lembrou que a maior força do mundo era a doçura e se acalmou. Ficaram vendo alguns patos, jantaram sopa no centro e retomaram a conversa, desculpou-se das palavras, estava sentido com a ida de Romualdo, sentia nele uma conexão ímpar, até marejou os olhos. Pensou em como ele sofreu, desde os catorze anos era obedecer hierarquia e comandos, seja de área militar ou ministros, aparentemente tinha motivo para não sair com a esposa que Gonzaga de Sá o casou mas se silenciou. Machado tinha tabelado Gonzaga de Sá como racional, mas durante dois dias dentro da morte do amigo ele se tornou sentimental, normal, jamais conseguiu compreender o que houve. Saíram pela rua, viam gente diferente de classes sociais, gêneros e ocupações. Gonzaga de Sá via aquela gente satisfeita e se questionava de haver certezas, ele sentia que haviam apenas crenças, esperanças. Machado não tinha resposta e pareceu que o outro não pedia uma. Foram tomar chopes no botequim, quando se despediram, Gonzaga de Sá anunciou que educaria Aleixo Manuel. Machado até pensou se Gonzaga de Sá viveria para tanto e se valeria a pena.

Capítulo XI – Era feriado nacional

Machado saiu de casa aborrecido depois das recordações. Era feriado nacional e havia festança, o narrador preferia estar bem longe. O narrador quis se embriagar no meio do povo e foi. Não sentia patriotismo e nem revolta no meio de povo, tropa e gente, mas um espetáculo em sua volta. Via duas pessoas discutindo sobre as forças da Pátria, analisava-os e analisava os generais. “A sociedade repousa sobre a resignação dos humildes.”. Era curioso esses dois homens, maltratados pelo tempo, celebrando um país que nada recebiam, só autoridades ganhavam e para eles ficavam com nada. Desviou o olhar ao encontrar com os olhos de um. Pensou nas injustiças do mundo, quis eliminar todas, fazer sua Utopia e ter um mundo que todos eram felizes. Tão rápido quanto criou, destruiu seu mundo, pois acreditava que as Artes, as Religiões e as Ciências perpetuavam e reciclavam preconceitos. Era melhor deixar esses pensamentos universitários de lado e não agir. Quis também derrubar tudo em sua volta e acabar com tudo, ninguém e nada era feliz afinal. Olhou a passeata, os mulatos, crioulos e negros e pensou que motivos históricos explicavam a vinda de tão longe e essa obediência a um sistema que os oprime. Pensou que tudo aquilo era besta de se pensar se podia ter a atenção em negócios e dinheiro. Aproveitou a passeata, desceu com ela em um sentimento de anulação e prazer e se deparou com o doutor Xisto Beldroegas, colega de trabalho de Gonzaga de Sá e bacharel em direito. Ia preocupado, conheceu-o mais por um relato de colega e de sua atividade mental, era obcecado e atencioso com a legislação cultural do Brasil e tudo que a rodeava. Procurava por papéis que resolvessem assuntos e ainda mais procurava resolver tudo em papel, atas, editais. Entendia menos ainda como a natureza não podia ser fixa ou proclamada, não entendia como o número de dia de chuvas, por exemplo, não era fixo, e achava que faltava quem o delimitasse em lei, e ainda mais se fosse ele, teria resolvido fazia tempo, pois nada era mais forte que o poder político, tudo era esmagado pela burocracia, repartições e indeferimentos para o indivíduo. Leis em âmbito que não fossem de política, com parágrafo, senador e capítulo eram bobagens. Hesitou em falar mas insistiu em falar e que ele falasse. Ele murmurou primeiro e depois disse que tudo era uma balbúrdia. Dava nem gosto de trabalhar, nomeavam conceitos errados, não entravam em acordo para que todos obedecessem e seguissem as doutrinas. Contava mais desgostos e perguntou de Gonzaga de Sá, parecia ter ficado doente e teve um delíquio, desmaio. Era perigoso em sua idade mas estava para aposentar, o doutor disse que perdia nada e nem grande coisa Gonzaga de Sá era, nem colocava os anos da República nos decretos, mesmo com 40 anos de casa. Tinha quem dizia que o doutor se aproveitaria da promoção quando ele saísse, mas ele tinha pena, disse com meia voz o resto. Continuava reclamando dos colegas de trabalho enquanto andavam e demorou para Machado conseguir escapar dele, quis ver Gonzaga de Sá, seu amigo. Apesar de ser perto das duas da tarde quando decidiu ir ver, escolheu ir às quatro para não incomodar. Depois de vinte dias sem vê-lo, foi recepcionado na casa por ele mesmo. Ele dizia que estava bem ao ouvir a notícia da doença, xingou o doutor, sentia-se incompatível com as pessoas ao seu redor, sejam velhos ossificados ou jovens abacharelados. Ficou triste com tudo que acumulou dos livros, achou que era o suficiente e não podia usar o que sabia para sua glória, sem filhos e sem como se expressar. Até comentou de quanto tempo passou perto de idiotas no trabalho, de um plano do chefe para Presidente da República que começasse como amanuense por promoções, para que o fosse apto, mas era muito tempo e muita paciência segundo Gonzaga de Sá. Machado ficou impressionado em como o amigo mudou, tinha perdido a ironia aguda e ficava irritadiço, deprimido e resignado. Olhou o céu, estava bonito, depois de rabiscos e um tempo, perguntou de novo quem o nomeou doente, ao ouvir a mesma resposta, maldisse o doutor. Mencionou um dia que ele quis falar de filosofia, fizeram um enorme esforço para começar e perguntarem como morreu Sócrates, Gonzaga de Sá ficou feliz de escapar de ser doutor. Machado riu e Gonzaga de Sá penava para acender um cigarro em meio aos tremores. Conseguiu ver os papéis do amigo enquanto o ajudava a acender o cigarro e tinham traços indecisos de fisionomia humana. Antes tinha pena deles, agora tinha ódio de como faziam retalhos do que ele dizia, eram apenas preocupados com títulos e mais nada, as conversas eram vazias, tentou mostrar ideias novas e era maldito pelas costas. Sentiu-se aborrecido de viver sozinho, de como seus amigos que poderiam entendê-lo eram poucos e bandidos e prostitutas tinham mais índole do que os graduados ao seu redor. Estava energético, Machado até pediu que se acalmasse em vão. Pensou tudo aquilo ser fruto da idade, que era disfarçado com a ironia e agora não dava mais para usar a máscara, após estar abalado com a morte do amigo. Gonzaga de Sá pediu perdão, perguntou se ele já o tinha visto assim, disse que não repetiria tal comportamento. Disse que Machado fez bem em ir, pediu para jantarem, passearem e ver tudo pela última vez, a juventude dele o faria bem. Não quis porque a gente do teatro lhe trazia hostilidade, mas cedeu, o jantar foi triste, Escolástica era indiferente ao que houve com o sobrinho, sem conselho ou consolo. Gonzaga de Sá se vestiu bem para a primeira classe, Machado mal tinha roupa para a segunda. Foram com antecedência comprar os ingressos, viam vários carros carregarem e cerimoniosamente trazendo gente. Gonzaga de Sá disse que metia dó aquele luxo. Viu as roupas, jóias, o misto de assento mal-feito e mal tratado. O presidente veio, tocaram o hino nacional e Machado ficava curioso com tanta gente importante no mesmo lugar. Os músicos afinaram os instrumentos e começariam. Viam as mulheres e comentavam, iam desde viúvas a esposas. Fechado o ato, saíram após os aplausos. Gonzaga de Sá lamentou como as pessoas de poder ali, político, econômico e social, eram pessoas de fora, desconectadas de 400 anos de história, levariam mais 400 para poderem se assimilar. Voltavam para a apresentação, os dois e todos em volta. Machado analisa antes quando ia a espetáculos, analisava e conversava em deleite com amigos, agora ele sentia uma intimidação sem nem precisar ouvir algo. Após a revolta do passado de universidade e a situação de classes, foram tomar cerveja. Gonzaga de Sá dizia que saía dessas coisas triste. Eram os mesmos no teatro 40 anos atrás, pessoas com poder e pouca capacidade e que nunca deixariam o lugar. Terminada a cerveja, Gonzaga de Sá quis saber onde Machado ia, era para casa, pediu para que dormissem na mesma casa dele e que arrumariam os livros no dia seguinte. Foram de bonde com pouca gente, Gonzaga de Sá viu uma mulher e ficou pensando e refletindo sobre tudo. Chegaram com os galos cantando e a saudação do preto Inácio.

Capítulo XII – Últimos encontros (capítulo importante)

Machado acordou bem disposto, viu aquele espaço todo em um estilo de casa que não existia mais no Rio. Foi tomar café e Escolástica estava lá, plácida, e o menino Aleixo Manuel comia o café e o via com olhos de mocidade. Até puxou o assunto dos estudos, perguntou de assuntos da história do Brasil ao menino, fez uma pergunta sobre descoberta da América e do Brasil, Aleixo respondeu com maestria e esforço, quis elogiar mas manteve silêncio, queria que a inteligência aflorasse lentamente. Após mais perguntas bem respondidas, aprontou-se, despediu-se e foi embora. Machado elogiou a inteligência do menino, Escolástica elogiava como estudava e como brincava, temeu se perder por começar tão bem. Até filosofou se poderia perder a vontade por desanimar no quão fútil é tudo. Escolástica negou, Machado foi procurar Gonzaga de Sá. Lia o Fígaro e adiou a organização dos livros. Ele tentava ler para estar acompanhado com as notícias, mas ficava atrasado porque queria ler. Gonzaga de Sá tratou do tempo como uma fatalidade e criação humana. Machado ficou quieto pois nada tinha para adicionar, exceto com a pergunta de Aleixo, ao qual elogiou a inteligência do garoto. Pegou os jornais do dia para ler, negou o almoço e chegaria tarde à repartição. Gonzaga de Sá até pediu que viesse mais, Aleixo ficava muito só. Estava mais atento ao menino, mudou mais ainda de comportamento depois da morte do amigo e essa adoção terna e figura paterna ao menino. Machado não sabia como se conectar, achava tudo aquilo um conto do vigário, algo muito elaborado para poder tratar mal. Mas ainda existia algo naquela tristeza, de filósofo demais e amigos de menos que não encaixava em toda sua tristeza. Piorava, parecia que perdeu a chance de reviver lembranças com o falecido amigo. Era errático, cansado, queixava-se, perguntou de novo a Machado se amava. Aleixo trouxe algo que não havia ou não queria trazer de volta na sua vida. Ia fazer de Aleixo gente, não fez, ia colher a flor e morreu, quem o fez gente foi a tia. Cresceram, talvez Aleixo jamais soubesse o que era ser feliz por ter conhecimento demais, talvez nem Machado devesse saber. Era muita gente velha se sacrificando, muita gente nova vindo, nada de comum acordo.

Contexto histórico – Próximo da década de 1930, perto da demolição do teatro Lírico, antigo Pedro II

Figuras de linguagem – Ironia, antítese, sinestesia Construções importantes – biografia cultural, dualidades narrativas, crítica social

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